Maria Teresa, uma mãe de meia idade, lamenta-se com uma amiga do trabalho que lhe dá a casa.
– Não fazes ideia, tanto trabalho e cinco filhos! Como não tenho quem me ajude…! Ainda se as miúdas fossem mais velhas!… ma só têm dez e onze anos! Se o rapaz, que é o mais velho fosse rapariga, dentro de poucos anos já poderia começar a ajudar-me.
Isabel, que é uma menina de seis anos, está muito contente e faladora. Conta às suas amigas, com muito orgulho, que a mãe “a deixou fazer a sua cama pela primeira vez”. Sente-se importante. A mãe sabe-o e permite-lhe fazer pequenas coisas, ainda que não fiquem perfeitas. Há já algum tempo que Isabel põe a mesa todos os dias e faz outros serviços.
Nestas duas breves histórias estão reflectidas diferentes estilos de entender a participação na vida familiar:
Maria Teresa não concebe que lhe possa vir alguma ajuda das suas filhas, apesar de a mais nova ter já dez anos. Tudo recai sobre ela, e o peso do trabalho manifesta-se num cansaço cada vez maior.
Pelo contrário, a mãe de Isabel encontrou na sua filha de seis anos uma colaboradora eficaz.
Sabe que o que lhe pedir não ficará na perfeição, mas não se importa, porque está convencida de que o importante é responsabilizá-la em pequenas tarefas muito concretas e que assim se sinta parte integrante do lar.
Em Portugal ainda há muitas famílias como a de Maria Teresa em que é a mãe quem se ocupa de modo exclusivo de tudo o que diz respeito ao cuidado e organização da casa – e com frequência “não deixa” que os filhos a ajudem porque “ninguém o faz tão bem como ela” – , enquanto que o pai, que trabalha todo o dia, concebe a casa como um lugar para descansar, no qual tudo e todos têm que estar dispostos em ordem à sua comodidade e relaxamento… E os filhos, por seu lado, não se dedicam em casa a outra coisa que não seja brincar, ver televisão ou fazer os trabalhos escolares.
Neste tipo de família a mãe não conta com outra ajuda que não seja a remunerada, cada vez mais difícil de conseguir, pela sua escassez ou pelos elevados custos. Só em ocasiões isoladas e com algo esporádico, encontra o auxílio de alguma filha mais velha, já que os rapazes, – por hábitos ancestrais – , não costumam estar obrigados a participar nas tarefas domésticas.
Nesta conformidade, estas mães não têm outra solução que não seja arranjar as coisas o melhor possível, simplificando trabalhos, organizando-se melhor e evitando aperfeiçoamentos inúteis. Maria Teresa e todas as mães que actuam como ela, têm de se aperceber de que o marido e os filhos se tornam extremamente exigentes, caprichosos e pouco compreensivos se não se habituarem a participarem nos trabalhos da casa.
A integração no lar
Para evitar cair nesta situação, muitas mães fazem que os filhos prestem alguns serviços que as aliviem em parte do peso da casa; do mesmo modo, muitos pais “modernos” oferecem-se voluntariamente para fazer pequenos trabalhos sem ver nisso nada de anormal nem que se lhes deva agradecer de forma especial.
Tanto no caso da mãe se dedicar exclusivamente ao lar como no caso de dividir o trabalho da casa com outra profissão que lhe ocupe parte do seu dia, – neste caso a organização e participação convertem-se em urgente necessidade – é preciso pensar que as ajudas do resto da família assentariam numa base muito pobre e pouco firme se unicamente se pretendesse um alívio do trabalho. O marido e os filhos realizariam essas tarefas, inclusive com o desejo de ajudar, mas não é somente este o objectivo que se deveria conseguir. O mais importante é que todos os membros da família se considerem como um bloco, cuja união é preciso alimentar continuamente à base da participação de todos. Quer dizer: que se veja o lar como uma ocupação comum na qual não se trata de que possam ou tenham o dever de participar, mas que têm o direito de o fazer desde que se tornaram parte dele.
É evidente que é mais eficaz e mais agradável conviver com pessoas que ajudam nas diferentes tarefas da casa não só por dever, mas sobretudo por um sentido de responsabilidade que adquirem livremente. Mas, para que se consiga este ambiente de colaboração, é preciso contar com o pai como um personagem decisivo. Não é possível imaginar uma família na qual a mãe e os filhos se afadiguem em diferentes tarefas e serviços enquanto o pai, lendo o jornal no seu sofá predilecto, deixa que o sirvam. Pode dizer-se que o espírito de ajuda é influenciado em grande parte pelo pai; com efeito, é mais fácil que os filhos compreendam o sentido da colaboração se vêem o pai integrado nela. Será então já mais difícil ouvir os rapazes desculparem-se com a frase “isso é trabalho de meninas”.
Organizar e participar
O Verão, possibilitando maior tempo de convivência da família e a mudança eventual para outros lugares de residência, é uma época muito propícia para tornar efectivos os bons propósitos que sobre a organização tenhamos podido formular. Por vezes, trata-se de projectos que não se sabe muito bem como pôr em prática e que tropeçam com a realidade de todos os dias.
Antes de pôr “mãos à obra” devemos passar em revista as circunstâncias pessoais de cada um que se não possam alterar (como o horário de trabalho, as crianças que vão ou não à escola). Entre o que custa mudar, – pelo menos de momento -, encontram-se, como é evidente, os hábitos e costumes (“maus hábitos” e “maus costumes” que não fomentam a participação) e o carácter de cada um. Tem de se contar com todos estes factores e com os “imponderáveis” que irão surgindo durante a execução, para que a organização não fique só em teoria.
Mesmo que toda a estrutura estabelecida para organizar a vida familiar se desfaça de repente, não devemos desanimar. Conseguir a colaboração de todos os membros da família custa muito mais do que parece à primeira vista, sobretudo, se até então existia num grau mínimo. É lógico e natural que, nos primeiros dias da “campanha pró-ajuda”, alguém possa descontrolar-se.
In Cadernos Educação e Família, nº 19